A Sombra e a Presença

Ecos do Silêncio


Saudações aos Fratres e Sórores da Conscendo,

Imagine acordar um dia e, ao olhar para a vida que construiu até agora, perceber que tudo o que acreditava ser verdade, de alguma forma, não é real. Seus sonhos, seus medos, suas escolhas — tudo o que considera parte de quem você é — foi moldado por forças invisíveis, de maneira tão sutil que mal percebeu. E, ainda assim, você se sente livre. Infelizmente, isso não é liberdade verdadeira.

Desde o início, fomos levados a crer que somos os compositores de nosso próprio destino, os autores de uma narrativa singular. Contudo, na vastidão do tempo, somos mais como figuras esculpidas em um relevo antigo, movidas por forças que precedem nossa chegada ao palco da existência. A sociedade, com suas expectativas entrelaçadas, os relacionamentos que nos envolvem como cordas de um marionete — tudo isso compõe um véu delicado, disfarçado de verdade. Desconfortável, sem sombra de dúvidas, mas esse desconforto é o primeiro raio que atravessa a escuridão. Diante desse vislumbre, é preciso agir, agora que estamos cientes do engano.

Essa inquietação, embora cortante, é o chamado do despertar. Habitamos uma esfera de vidro, uma matrix que entrega respostas prontas e delineia escolhas com mãos alheias. Romper essa bolha começa com um único ato: o questionamento. Como o vento que desafia a quietude das águas, erga a voz da dúvida. A jornada se inicia na pergunta, e não na resposta.

Ao voltar-se para o espelho da ilusão e do real, algo se transforma. As regras que seguíamos, como platônicas sombras cegas, os medos que nos governavam como sentinelas, começam a desvanecer. A vida, antes um roteiro ensaiado, revela-se uma tela em branco, um espaço onde o ser pode traçar seus próprios contornos. Pare por um instante e contemple: abandone o reflexo distorcido e descubra quem você é na luz pura da escolha.

Você não se encontra sozinho nesse limiar. Este é o portal onde muitos fratres e sórores, cansados de apenas existir, decidem verdadeiramente ser. O teatro da vida se desdobra diante de nós — o papel que você interpreta não foi escolhido por suas mãos, mas imposto por um diretor invisível. Desde o berço, fomos ensinados a nos curvar, antes de erguer os olhos, a aceitar, antes de duvidar. O mundo nos oferece verdades moldadas em pedra: o sucesso é uma moeda reluzente, o amor é posse, a felicidade é um destino fixo. Essas leis foram gravadas nas linhas de nossa mente por outros. O valor de um homem não está em conquistas socialmente impostas.

A existência, em sua essência, é um palco vasto e intrincado, onde vestimos máscaras forjadas por outros, recitamos falas que não escrevemos, buscamos aplausos que ecoam no vazio. Aqueles que ousam abandonar o script são chamados de excêntricos, de loucos, silenciados pelo coro da conformidade. Não é sinal de sanidade ajustar-se a um mundo que jaz em profunda desordem. Seguimos dançando ao ritmo de um tambor que não vemos.

Corremos atrás de miragens — metas que não abraçamos por vontade própria, desejos que não nasceram em nosso âmago. Não há prêmio que justifique essa corrida. O homem que trocou a família pela fortuna descobre que o ouro é frio ao toque. O artista que sonhou com a fama e a conquistou percebe que ainda sente um vácuo dentro de si. O jovem que seguiu o caminho traçado, passo a passo, ainda ouve o sussurro de um vazio interno que não sabe explicar. Viva a melodia de sua alma, em vez de ecoar a canção alheia.

Se esse chamado ressoa em você, permita-se afirmar e reescreva os acordes de sua história. Somos algo além das notas que nos ensinaram a tocar. Desde o primeiro respiro, nos dizem quem somos — um nome, uma nação, uma crença. Camada por camada, somos esculpidos pelos olhares dos outros, até que o ser original se torne um reflexo distante. Essa identidade é uma jaula e não um lar.

Mas, em meio a toda essa ilusão, resta algo real. No instante de seu nascimento, você era um vazio sagrado, uma página ainda não escrita. Sem nome, sem medo, sem dogma — apenas presença. Então, o mundo começou sua obra, tecendo sobre você os fios daquilo que chama de 'eu'. Você existia antes desse tear começar a girar. Muitos se perdem nesse ponto — e se decepcionam ao tentar preenchê-lo com ouro, afeto ou reconhecimento. A verdade não repousa fora, mas no silêncio primordial interno que habita o coração.

Solte essas amarras. Desfaça os véus da matrix que obscurecem sua essência e vislumbre a liberdade em sua forma mais pura. Você se sente livre, mas seus pensamentos são apenas espelhos da sociedade que o formou. Seus desejos não são seus, suas buscas foram plantadas em solo alheio. Descubra quem você é deixando para trás essas raízes impostas.

Olhe para a sua vida. Cada escolha, cada veste que enverga, cada reflexo no espelho — é herança de um passado que não questionou. A mente teme o vazio, pois nele não há onde se agarrar. Por isso, enchemos o silêncio com ruídos — o celular que brilha, a música que preenche, as palavras que dissipam a quietude. Acolha o silêncio como um aliado. Escute a voz sutil que emerge dele, a intuição que desvenda os mistérios, sem necessidade de mestres externos. Como o intervalo entre as notas de uma sinfonia, esse espaço revela a verdade.

Atravessar o vazio sem temor desvela a verdade. Schopenhauer, com sua lente sombria, via a vida como um ciclo de desejo e carência — o erro não está em desejar, mas em crer que somos os autores do desejo. Pare e contemple: cada pensamento, cada anseio que guia seus passos foi semeado por outro. Tudo o que você é foi colocado sobre seus ombros. O verdadeiro ser se revela quando as camadas caem.

O medo é a corrente que nos prende, o escultor que molda nossos limites. Erga os olhos além dele. Somos algo além do peso do temor, além dos rótulos que nos entregaram antes mesmo de nascer. Essas afirmações, como pedras lançadas em um lago, criam ondulações na superfície de nossa alma. Nesse movimento, algo desperta.

Fomos ensinados a obedecer, a aceitar, a seguir as trilhas já abertas. Ninguém nos guiou ao interior, ao mistério de nossa própria essência. Um ser desperto, livre das correntes invisíveis, não se curva ao roteiro alheio. O medo é o alicerce de toda ordem social — isso é verdade. O medo nos mantém alinhados, silencia o grito da dúvida. A prisão só existe enquanto acreditamos nela.

Atravesse esse limiar. Transcenda o papel de simples personagem e torne-se o autor de toda a trama. A chave sempre esteve em suas mãos, oculta no silêncio que você tanto evita. Não siga o eco das vozes externas, mergulhe na quietude, onde o ator se dissolve e o Eu verdadeiro se manifesta. No silêncio, na pausa entre os atos desse grande teatro, a verdade sussurra: você não é o papel que interpreta, mas a presença que o observa. Você é algo além do que lhe disseram para ser. Aja agora.

Sinceros desejos de Ascensão
Conscendo Sodalitas